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quinta-feira, 20 de outubro de 2005

Jornalismo sem fronteiras

Você já notou que o noticiário internacional ocupa um espaço relativamente pequeno na maioria dos jornais e que na maioria das vezes o texto é feito por agências internacionais (ou nacionais quando se tratam de jornais de médio e de pequeno porte)? Será mesmo que as notícias têm o peso que merecem? Como é o perfil de quem faz as notícias e de quem as lê? Essas são perguntas que podem ter as respostas encontradas no livro “Jornalismo Internacional” da Editora Contexto, escrito por João Batista Natali, que foi correspondente na Folha de São Paulo.

O livro Jornalismo internacional, escrito pelo jornalista João Batista Natali, é uma verdadeira aula sobre o tema, que possui pouca obra relacionada a ele. No decorrer da leitura, encontra-se o perfil do leitor da editoria internacional, o que é preciso para ser um bom jornalista dessa área, além de um pouco da história do jornalismo internacional e da trajetória da Folha de São Paulo, no quesito em questão.

Através de uma linguagem simples, foi redigido num tom coloquial, fazendo parecer que o escritor conversa diretamente com quem lê. Ele não se intimida em cortar o assunto e indicar um livro para aprofundamento. E, a todo instante, faz convites para serem feitas mais pesquisas relativas ao jornalismo internacional.

Para Natali, essa editoria deve receber uma atenção especial, pois “o leitor faz parte de um segmento minoritário e mais bem informado. É um leitor que possui critérios menos provincianos e mais metropolitanos de interesse”.

Mas, como seria o perfil ideal de um profissional que trabalha com esse tipo de jornalismo? Um fator importantíssimo seria a curiosidade pela História. Isso porque é “equivocada a idéia de que o jornalista lida apenas com a atualidade. Não há competência profissional sem que tenhamos uma visão clara daquilo que está historicamente por detrás da notícia e que as agências internacionais não transmitem”.

Assim como nos demais setores, a crise econômica atingiu as redações. O que era um trabalho exclusivo dos jornalistas do noticiário internacional passou a ser atribuído aos demais funcionários das outras editorias. Tudo para que fossem reduzidos os gastos com correspondentes no exterior.

Até a qualificação do jornalista deve ser melhor do que nos anos anteriores, já que “se passou a exigir mais dos redatores das editorias internacionais”. Afinal de contas, custa caro manter um profissional fora do país.

O jornalista da área ainda passa por um grande desafio: o de dar uma nova roupagem ao texto, pois eles são padronizados pelas agências e enviados para todos os jornais. O uso exclusivo das imagens e textos de agências ocasiona uma monotonia na cobertura internacional. Como diz o autor, “a competência jornalística consiste em colocar uma linda cereja nesse mesmo bolo antes de servi-lo”.

É preciso saber falar inglês e espanhol fluentemente, haja vista que as agencias não dispõem mais de serviços em português. O jornalista precisa entender a “linguagem diplomática”. Mas isso não significa que os outros idiomas não sejam essenciais porque “a importância deles está diretamente associada à influência econômica e política dos países que os falam”. E, para quem ainda não atentou para o estudo das línguas estrangeiras, João Batista Natali avisa: “o jornalista monoglota é uma raça em extinção. Foi pelas editorias internacionais que eles começaram a ser extintos”.

O noticiário internacional vai além da cobertura de guerras e assuntos diplomáticos. Ele foi invadido pela onda “people”, composto pelas notícias das celebridades mundiais. O escritor utiliza a teoria de Theodor Adorno para explicar o motivo da atenção, com relação à curiosidade sobre os famosos, ser desviada da vida profissional dos artistas para a pessoal. Seria um “fetiche” da mercadoria cultural. As páginas dos jornais são invadidas pelo assunto porque “a fronteira entre o jornalismo e entretenimento nem sempre é muito nítida”.

História – O autor faz uma viagem na história do jornalismo internacional, que se confunde com a própria história do jornalismo. Nesse aspecto, João Natali desmistifica alguns lugares comuns dessa história. Para ele, acreditar que o setor surgiu no século XIX é um equívoco. Outro erro seria acreditar que a notícia se tornou “mercadoria” apenas com a consolidação do capitalismo, o que ocorreu já no mercantilismo.

O alemão Jacob Függer von der Lille, o mais importante banqueiro europeu nas primeiras décadas do século XVI, foi o criador da newsletter. Os agentes de Függer enviavam, regularmente, informações que afetariam os negócios. Natali diz que foi “o embrião do jornalismo econômico e político, voltado para assuntos internacionais”.

“Függer e seu embrião de newsletters impressas permitiam a manutenção de uma rede que fazia as informações circularem por circuitos paralelos aos utilizados por duas redes previamente existentes, a rede diplomática, que orientava monarcas, e a rede eclesiástica, que orientava dirigentes da burocracia na Igreja”, explica João Batista Natali. Dessa maneira, “a informação foi comercializada como instrumento para produzir eficiência e poder nos negócios”.

Esse é só um pequeno exemplo que demonstra que o “jornalismo não pode se apequenar, fornecer da atualidade uma visão que será negada pelos historiadores”.

quinta-feira, 13 de outubro de 2005

Dependência e desenvolvimento na América Latina

Fernando Henrique Carodoso formou-se em Ciências Sociais, em 1952. No ano seguinte, tornou-se auxiliar de ensino da cadeira de Sociologia I. Em 1955, Florestan Fernandes, nomeou-o primeiro assistente. A geração de Fernando Henrique acompanhou a visita de Jean Paul Sartre ao Brasil, em 1960.

Na universidade era marxista e desenvolveu estudos sobre Karl Marx. Também tiveram influência sobre ele: Montesquieu, Tocqueville, Max Weber, Sérgio Buarque de Holanda e Joaquim Nabuco.

Em entrevista à Folha de São Paulo, em 1996, o próprio FHC definiu-se da seguinte maneira: “(...)Quer dizer, é preciso estar mais próximo da vida para poder fazer trabalho intelectual. Nunca fui intelectual do gênero somente 'ler autores'(...)tenho um pouco de aversão ao 'comentarismo'. Parece uma forma pobre de ser intelectual(...)Claro que é preciso ler bem e detidamente as coisas. Mas quando o sujeito tem força, vai ver o que está acontecendo na realidade, tenta explicar, tentar avançar. Senão você fica fechado no círculo, lê, relê, trelê, volta a ler, comenta uma coisa, comenta outra. Acho que aí cai no academicismo, no mau sentido”.

Em 1970, escreve juntamente com o chileno Enzo Faletto, “Dependência e desenvolvimento na América Latina”, mais conhecida como a “teoria da dependência”. Ainda de acordo com a Folha, na teoria da dependência “o comércio internacional favoreceria os países ricos encarecendo os produtos de ponta e desvalorizando os produtos primários e pouco manufaturados dos atrasados, parecendo se manter, a não ser em casos monopolizados como o do petróleo, sendo aí vantagem estar no setor primário e não se livrar dele”.

Para FH, a ditadura militar favorecia o crescimento econômico e a modernização. E, esses eram fatores essenciais da democracia. José Carlos Reis, autor do livro As identidades do Brasil: de Varnhagen a FHC declara que Fernando “submete a paixão à razão”. Com isso, afirma que o sociólogo paulista, ao contrário de Darcy Ribeiro, não pensa emocionalmente. Ele tenta analisar imparcialmente os fatos. Segundo FHC, a justiça social só seria possível com o desenvolvimento do capitalismo e da civilização tecnológica. Os países estão interligados através de investimentos industriais. As empresas estrangeiras têm uma participação importante no “desenvolvimento” da América Latina. “Tanto o fluxo de capitais quanto o controle das decisões econômicas ‘passam’ pelo exterior”, diz FH. “As decisões de investimento também dependem parcialmente de decisões e pressões externas”. As multinacionais dominam os setores-chave da economia.

“O desenvolvimento do setor industrial continua dependendo da ‘capacidade de exportação’ de bens de capital e de matérias-primas complementares para o novo tipo de diferenciação do sistema produtivo (o que conduz a laços estreitos de dependência financeira), e ademais essa forma de desenvolvimento supõe a internacionalização das condições do mercado interno, que ocorre quando nas economias periféricas organiza-se a produção industrial dos setores dinâmicos da moderna economia. E, quando se reorganiza a antiga produção industrial a partir das novas técnicas produtivas”.

Em sua obra, FHC cita bastante a condição do México, que seria um exemplo para os demais países latino-americanos.

Há uma radicalização mais teórica, todavia mais política do que teórica. Ele faz uma reflexão sobre o método dialético materialista. Aponta dois equívocos da derrota de 1964: erros de interpretação e outros fatos novos que culminaram na aliança da burguesia com o imperialismo e as elites tradicionais. Dentre esses fatos, destacam-se: a Revolução Cubana, a atividade sindical, entre outros.

Fernando H. Cardoso e Gilberto Freyre aproximam-se no seguinte ponto: os dois transformaram coisas “maléficas”, em (digamos...) “benéficas”. No caso de Freyre a miscigenação e a escravidão viraram coisas normais, já para FHC, a postura dotada foi em relação à dependência dos países latinos, inclusive o Brasil.

Analisa a economia colonial, tenta enxergar a influência e as conseqüências da escravidão no Brasil. “O avanço e a modernização do capitalismo dependem do fim da escravidão”. Não apenas aquela escravidão dos negros africanos, mas também a diária, que ocorre no Brasil. Há dois tipos de industriais no Brasil: o associado ao capital estrangeiro, e aquele que conseguiu capitais adquiridos no trabalho da lavoura.

O desenvolvimento e a dependência podem existir em um mesmo país, no entanto não são associadas; elas existem separadamente.

Ele fala dos países latino-americanos dentro do contexto global, porém não esquece da especificidade de cada local.

Na conclusão do livro “Dependência e desenvolvimento na América Latina”, FHC afirma que o principal objetivo é “reconsiderar os problemas do ‘desenvolvimento econômico’ a partir de uma perspectiva de interpretação que insiste na natureza política dos processos de transformação econômica”.

“A existência de um ‘mercado aberto’, a impossibilidade da conquista dos mercados dos países mais desenvolvidos pelas economias dependentes e incorporação contínua de novas unidades de capital externo sob a forma de tecnologia altamente desenvolvida e criada mais em função das necessidades intrínsecas das economias maduras do que das relativamente atrasadas fornecem o quadro estrutural básico das condições econômicas da dependência. Mas a combinação destas com os interesses políticos, as ideologias e as formas jurídicas de regulamentação das relações entre os grupos sociais é que permite manter a idéia de ‘economias industriais em sociedades dependentes’. Portanto, a superação ou a manutenção das ‘barreiras estruturais’ ao desenvolvimento e a dependência dependem, mais que de condições econômicas tomadas isoladamente, do jogo do poder que permitirá a utilização em sentido variável dessas ‘condições econômicas’”.

Fernando Henrique parece apoiar o que está acontecendo, a união com o capital estrangeiro. A obra dele possui elementos teóricos que a diminuem como teoria científica. O conceito de dependência é impreciso, ambíguo (dependência externa e estrutural). Também não tratou de uma possível ruptura da dominação capitalista, que teria como conseqüência uma revolução socialista. O estudioso Lawrence Harrison critica Fernando. Harrison acha que a “Teoria da Dependência - uma espécie de doença infantil da América Latina - escondeu aos latino-americanos o peso de sua herança cultural. Ora, FHC e Enzo Faletto podiam acreditar que os males da América Latina fossem devidos ao então proverbial imperialismo ianque. Mas eram ambos cultos demais para não ter uma idéia dos fatores propriamente culturais também em jogo. Resumindo: o Brasil teve um crescimento econômico assustador durante 20 anos e tem enfim instituições democráticas, mas não por isso realiza as condições mínimas de igualdade e comunidade de uma sociedade moderna. É culpa dos norte-americanos? Não. Então é uma questão cultural”, ele conclui.

Entretanto, a principal crítica que se pode fazer ao sociólogo é porque ao se eleger Presidente da República, mandou o povo brasileiro esquecer o que ele havia escrito. Prova do caráter volátil do digníssimo Fernando Henrique Cardoso.

quarta-feira, 5 de outubro de 2005

Pós-modernismo: a lógica do capitalismo tardio

A tese central do texto de Frederic Jameson afirma que o pós-modernismo seria uma extensão cultural do capitalismo tardio. Dessa forma, só existiria onde houvesse o desenvolvimento do capitalismo. Não havendo, portanto, numa sociedade indígena. Deve-se levar em consideração a época na qual a obra foi escrita: anos 80. Nesse período, o mundo passava por transformações, o muro de Berlim caíra. Isso reflete no texto de Jameson.

No pós-modernismo tudo é instável, inconstante, tem-se aversão a tudo que for de longa duração. Ao contrário do modernismo e suas idéias, originárias do final dos anos 50 e início da década de 60. Como exemplo dessa instabilidade tem-se os ataques terroristas de 11 de setembro (nos Estados Unidos) , 11 de março (na Espanha), 7 de julho (Londres). A população está totalmente vulnerável e o imprevisto pode acontecer a qualquer momento. Até o terrorismo é um espetáculo feito para ser televisionado.

Impera a sociedade do simulacro. As coisas são superficiais, não há tempo para nada, e muitas existem sem que se saiba as utilidades delas. A estética, o visual tem um papel relevante, já que como falta tempo para se aprofundar em algo, as primeiras impressões são fundamentais. Daí vem todo o apelo visual encontrado no mundo de hoje.
Nada é novo. A partir do instante que surge, passa a ser velho; graças à velocidade dos meios de comunicação. A humanidade é esquizofrênica - no sentido literal da palavra – haja vista que exerce múltiplos papéis. E essa multiplicidade é decorrente de uma característica do pós-modernismo: a heterogeneidade. Há coisa para todos os gostos, elas convivem paralelamente, como numa “bricolagem”, sem se misturarem.

O que importa é ser diferente. Enquanto no modernismo, “o diferente” estava longe de nós, no pós-modernismo ele está bastante próximo.

Há uma exacerbação da cultura, mas não porque seria um direito do cidadão ou algo do gênero. Essa revalorização ocorre porque a cultura consiste num mercado rentável. Tudo é feito para ser vendido. E, no centro dessa produção cultural estão os Estados Unidos, que fabricam a cultura deles para ser absolvida (leia-se imposta) pelo restante da população mundial. Esse fato não deixa de ser um reflexo da hegemonia econômica e política americana perante os demais países.

Jameson utiliza-se bastante da arquitetura para explicar as características do pós-modernismo. Através dela, prova que o indivíduo está mais propenso ao isolamento. Os grandes edifícios vão se transformando em verdadeiros feudos, onde não é preciso muito esforço para se encontrar o que quer.

O passado também não existe no pós-modernismo, caso igual ao da História, que contada pelos vencidos, estaria passível de erros. Até as produções cinematográficas que têm como enredo temas épicos, estão mais preocupadas em retratar a parte estética, como a arquitetura e a moda. A História fica apenas como uma “atriz coadjuvante”.

Outro aspecto que está em segundo plano no pós-modernismo é o afeto. Trata-se da era da falta de expressão e da ansiedade. “Nossa vida cotidiana, nossas experiências psíquicas, nossas linguagens culturais são hoje dominadas pelas categorias de espaço e não pelas de tempo, como o eram no período anterior do alto modernismo”, escreve Frederic Jameson.

Ao mesmo tempo em que há uma fragmentação na pós-modernidade, existe um sentimento de “coletivismo”, mas no sentido de que as pessoas não passam de números, são vistas como “mais uma”. O autor diz que “o desaparecimento do sujeito individual, ao lado de sua conseqüência formal, a crescente inviabilidade de um estilo pessoal, engendra a prática quase universal em nossos dias do que pode ser chamado de pastiche.” Isso seria “o imitar de um estilo único, peculiar ou idiossincrático, é o colocar de uma máscara lingüística, é falar em uma linguagem morta”.

O pós-modernismo não é para ser compreendido, apenas vivido. Porque do mesmo modo que o passado esmaeceu, não há perspectiva de futuro, não se sabe o que virá depois dele...